quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Textos de Gilberto Freire abordam o contraste social

Visão panorâmica favela Abençoada por Deus,Vila SAnta Luzia,bairro Torre, Recife-Pe
Visão panorâmica favela Abençoada por Deus,Vila SAnta Luzia,bairro Torre, Recife-Pe
Certamente se Gilberto Freire, sociólogo e cientista político, nascido no Recife-PE em 15 de março de 1900, e falecido em 18 de setembro de 1987, estivesse vivo continuaria a desenvolver o reflexo das suas duas obras mais significantes: Casa-grande & Senzala e Sobrados & Mocambos. E na visão antropológica desse recifense o próximo conjunto literário poderia se chamar Refavela.
Em Casa-Grande & Senzala, livro publicado no Rio de Janeiro em dezembro de 1933, Gilberto Freire faz uma abordagem inovadora da vida familiar, dos costumes públicos e privados, das mentalidades e das inter-relações étnicas que revelam um painel envolvente e instigante da formação do povo brasileiro no período colonial. Da arquitetura real e imaginária da casa-grande e dos fluxos e refluxos do cotidiano da família patriarcal, emergiram traços da convivência feita de intimidade e dominação entre senhores de engenho e escravos, além da mistura entre brancos, pretos e índios que marcaram para sempre a sociedade no Brasil.
Anos depois, também no Rio de Janeiro, Freie publicou outro ensaio que trata da relação de poder e hierarquia social que existia entre os senhores de engenho e escravos. Em 1936, ele publica o livro que é uma continuação da série iniciada com Casa-Grande & Senzala: Sobrados & Mocambos.  Nesse clássico literário, o sociólogo e cientista político avalia o declínio do patriarcalismo rural do século XIX. Enfraquecida pela decadência da escravidão e pressionada pelas forças da modernidade que vinham de fora do país, a aristocracia se vê obrigada a trocar a casa-grande pelos sobrados urbanos, enquanto seus ex-escravos saem das senzalas e instalam-se nos casebres de barro e palha dos bairros pobres das cidades.
Após quase sete décadas da publicação de Casa-Grande & Senzala e Sobrados & Mocambos, essas obras continuam repercutindo no imaginário acadêmico não apenas nacionalmente, como também no exterior. Os livros, como queria o autor, se mantêm vivos e contemporâneos, mostrando a relação de poder nos sistemas político, social, religioso e cultural do povo brasileiro. As publicações ainda se consagram como obras fundamentais do pensamento da sociedade no Brasil.
Atualmente, as relações de poder continuam as mesmas. Por um lado, o senhor de engenho passou a ser o empresário detentor dos meios de produções que se refugia nos edifícios da alta sociedade. Por outro, existem os empregados que deixaram de ser “escravos” e passaram a vender a sua mão-de-obra para os patrões, além de habitarem as margens dos rios com suas palafitas.
Com isso, percebe-se facilmente que a dicotomia da relação de poder e hierarquização político-social existente entre senhor e escravo, patrão e empregado continua acesa no imaginário de ambos e incrustada no mais profundo sentimento humano, mostrado que, embora os tempos mudem e as situações também, a dominação e a superioridade em relação ao outro continuam, pois o que muda, de fato, são as categorias. Os atores sociais continuam os mesmos.
Por isso, Refavela, um vídeo documentário realizado partir de ensaio fotográfico produzido entre os anos 2006 e 2008 na favela Abençoada por Deus, comunidade da Vila Santa Luzia, bairro da Torre, região periférica do Recife-PE, coloca em questão e evidencia a relação de poder existente entre os edifícios e palafitas, um ensaio baseado nas obras Casa-Grande & Senzala e Sobrados & Mocambos, de Gilberto Freire, sociólogo e cientista político que teve a sensibilidade científica e humana de registrar em seus ensaios a realidade hierárquica brasileira de séculos passados e que se perpetua ate os dias atuais.
Texto e foto por Leodomiro Neto
Ver fotos: http://www.flickr.com/photos/leodomiro-neto

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